22 de abril de 2011

SOBRE A COLUNA DO ARTUR XEXÉO DE 17 DE ABRIL DE 2011

Prezado colunista,
Bom dia,


Confesso que senti um grande alívio quando acabei de ler a sua última coluna. Digo isto porque é muito bom ver uma figura pública, um jornalista, cronista de um jornal de grande veiculação expor com tanta propriedade aquilo que nós, meros mortais, sentimos e não temos como falar. Podemos até postar uma notinha aqui ou ali na internet porém, nada que dê visibilidade. Uma opinião como a sua, vindo de uma e-lebridade como você, pode sim fazer a diferença.

A questão é que você está certo. A discussão do desarmamento não cabe neste momento. Entendo que há outras coisas de muito maior gravidade que não estão sendo vistas com a mesma seriedade e, arrisco a dizer, empolgação.

Você tocou na questão do bullying e da segurança nas escolas. Se me permite, considero assuntos de searas distintas. O primeiro, "o índio mais brabo", é o que realmente precisa ser dominado primeiro.

Podem até me achar maluca porém, ouso dizer que criança é bicho ruim. Não ruim no sentido que se queira entender mas, no fato de que, quando uma criança quer, ela põe qualquer um no lixo amparada pela tal da inocência, da espontaneidade, da sinceridade, tão cantada em verso em prosa. Só que estes requisitos de inocência não são mais aqueles que nós tínhamos no tempo em que você cavalgava seu cabo de vassoura.

Hoje, se o coleguinha não se enquadra no perfil de determinada tribo, se ele(a) não é bonito(a), ele o melhor em campo ou ela líder de torcida, se ele é gordo (a), dentuço(a) ou tem o cabelo ruim, vão sofrer sim. Porque criança é bicho ruim e adolescente é bicho pior (e maior).

Aquelas agressões psicológicas vão se cristalizando silenciosamente dentro dele até o dia da vingança.

Se ele for esperto, forte e são, vai dar o sangue para subir na vida, virar um empresário de sucesso rico e bem sucedido e depois olhar lá de cima e pisar naqueles que o fizeram sofrer. Se ele for fraco, tiver uma pré-disposição genética para doençla mental e o pé na Doidolândia vai comprar uma arma i-le-gal-men-te para matar seus algozes ou quem o faça lembrar deles. Vai se tornar um Wellington. Percebe a sonoridade de Wellington-Bullying?

Porém, a questão não acaba aí. Ao contrário, ela se desdobra em tantos braços que fica até difícil estabelecer responsabilidades. Veja bem: eu NÃO ESTOU como advogada de defesa do rapaz. Isto precisa ficar muito claro. Não estou justificando seu ato, apenas tentando entender.

Em primeiro lugar, vem o papel da família. Ah! a família.... as pessoas falam tanto em família mas me dão a impressão de que não tem a menor idéia do que estão falando. Entendo que família é uma Instituição muito séria e como tal deve ser respeitada. Família é a célula do corpo social. Quando as famílias adoecem todo o corpo social entra em colapso. Quanto mais doentes forem as famílias mais doente será a nossa sociedade. As pessoas não andam lá cuidando muito bem das suas famílias e o que se vê é este câncer social metastizado para todos os lados, resistente a qualquer tratamento.

Se os pais soubessem o quanto vale dizer aos filhos que não é justo nem correto ofender alguém, quem quer que seja, por qualquer motivo! Esta orientação deveria vir desde a canção de ninar no berço, como um mantra. Se os pais estivessem mais próximos do seus filhos muito comportamento ruim poderia ser percebido e até cuidado.

Imagino que você deve estar pensando "lá vem esta doida falando em família". O fato é que ela, como elemento de construção de personalidades e gerenciamento de conflitos não pode se permitir ficar alheia ao que acontece com os seus membros. Se a família faz um link direto com a escola e ambas caminham juntas no entendimento da personalidade e do comportamento de nossos jovens dá para saber o que rola com as nossas crianças e adolescentes. Basta ter olhos de ver e ouvidos de ouvir.

Eu lembro muito bem que quando eu pisava na bola tinha que entregar a maldita caderneta junto com a advertência solicitando a presença dos meus pais na escola. E o pior é que eles iam. Que vexame! O certo era ser no Bem e uma advertência pegava mal para caramba. Enfim, que bom que meus pais sempre atenderam aos chamados da escola. E que nem foram tantos porque minha mãe jogava nas onze e travava bonito. Quando eu menos esperava ela aparecia, do nada, na minha frente a título de inspeção administrativa. Como estes aparecimentos eram aleatórios, só me restava andar na linha.

Fica óbvio que este rapaz assassino-suicida tinha problemas. Em que ponto da estrada nem a família, nem a escola perceberam alterações psicocomportamentais? Foram deixando o monstro crescer, talvez até o alimentando e deu no que deu. Quantos outros monstros não estarão sendo alimentados por aí?

A sociedade nos empurra goela abaixo que sejamos magros, com aparelhos nos dentes, chapinha no cabelo e que tenhamos acesso a toda a parafernália eletrônica e grifes de moda. Quando a criança-adolescente não se encaixa ela neste perfil está fora, out, off. Se a sua família não dá uma base sólida para lidar com estas adversidades, como eu já disse, o cara corre mesmo o risco de pirar. Ora, ora, se existe tanto adulto por aí que até hoje ainda precisa se sentir parte de um grupo (aliás, tribo é palavra da vez, virou modinha), porque este tipo de pressão não atingiria alguém em formação de personalidade?

Agora vem um outro braço desta situação: a questão da punição. Se alguém chama um cara de crioulo fica preso sem fiança. Se este mesmo alguém enfia a porrada em uma criança a gente faz o que? Se este mesmo cara enfia a porrada na mulher temos a Lei Maria da Penha. Se ele arria o toco nos filhos qual é mesmo o nome da Lei?

Volta o filme. Visualiza o garoto lá na escola bombardeado pelo bullying e a família ausente. Combinação explosiva, concorda? O resultado não pode ser bom. O resultado não foi bom.

Passemos agora ao braço citado por você sobre a segurança nas escolas. Sabe de quem eu lembro? do Sr. Wilson, um dos inspetores lá da escola. Sr. Wilson sentia cheiro de armação no ar. Era um senhor alto, gentil, sério, falava baixo, super educado com um pequeno detalhe: impunha um respeito! vixe! Naquela época eu não percebia mas, hoje eu entendo que o Sr. Wilson, e todos os outros inspetores, conheciam cada um de nós e do que cada um era ou não era capaz. Eles sempre sabiam se estávamos na escola ou não, se tínhamos chegado tarde ou saído cedo. Não adiantava inventar. Nada passava pelo crivo dos nosso inspetores. Principalmente do Sr. Wilson. O melhor a fazer era ficar, como se dizia, "pianinho" ou lá vinha advertência. Ah! tinha suspensão com apresentação de trabalho na volta às aulas para os delitos mais graves.

A pergunta do programa é: onde andam os inspetores das nossas escolas? Onde andam os Srs. Wilson? Onde estão aqueles que conhecem os alunos por nome, sabem onde moram e até o horário de suas aulas? Se as escolas tiverem os seus Srs. Wilsom com certeza não vão precisar de policias armados.

Agora, a parte delicada da questão quando se fala desse massacre. Delicada porque envolve vontade política e responsabilidade do Governo e isto anda meio em falta no mercado. Você citou o controle das nossas fronteiras e da venda ilegal de armas. Tenho uma notícia muito triste; isto não tem jeito. É como procurar palha em palheiro porque até agulha você acha se usar um ímã. Nesta quesito a nossa nota é zero. Perdemos, caro colunista. Perdemos.

Por isto, como você muito bem colocou, falar de desarmamento, neste momento, é discurso estéril.
Veicular vídeos de crianças trocando revolver de água por gibis é pura maquiagem. Por isto seu texto me sensibilizou.

Finalmente, só para dar uma levantada no astral, gosto de citar um ditado chinês que diz: "A pior coceira é a que não se pode coçar". Não podemos "coçar a coceira" do controle das fronteiras e da fabricação de armas, isto está fora do nosso controle.. Mas podemos "coçar a coceira" de cuidar mais de perto dos nossos filhos, observar com mais atenção suas alterações de comportamento, plugar com as escolas de forma a prevenir agressões que os nossos filhos possam ser vítimas e evitar que eles vitimizem alguém.

Vamos deixar as responsabilidades de Governo com o Governo. Vamos tentar diminuir os efeitos colaterais das tragédias urbanas coçando a nossa própria coceira. Quem sabe (re)começamos por aí e evitamos o súbito aparecimento de um outro Wellington?

Abraços fraternos e uma Boa Páscoa.
Virginia Meirim